Para quem não conhece o Distrito Federal, entender o padrão de endereços da capital pode ser complicado. SQN, SQS, SAAN, SAIN, QSA, CSA, “M” Norte, QE, QI. Essas são apenas algumas das siglas, espalhadas por todas as regiões do DF, que dão nó na cabeça de turistas, moradores, atendentes de telemarketing… Ainda por cima, não existem bairros como no resto do país. Mas há outra questão que confunde: a falta de um posicionamento único sobre as divisões da capital.
O artigo 10 da Lei Orgânica do DF deixa clara a organização em regiões administrativas, com a proposta de descentralização. Mas isso não responde a questão. Marisol Carvalho da Silva, 38, se mudou para Ceilândia há dois anos e ainda tem dúvidas. Ao procurar assistência social, o atendente preencheu o campo “Cidade” como “Brasília” e, no bairro, “Ceilândia. Mas as duas não são regiões administrativas diferentes? E nenhuma das duas é bairro ou cidade.
Nem estado nem município
O Distrito Federal não é município nem estado. Como entidade federativa única no país, é regido por lei orgânica, típica de municípios. Como os estados, tem apenas governador. As RAs não têm autonomia – são comandadas por administradores submetidos ao GDF.
A Constituição proíbe a divisão do DF em municípios, mas afirma que o distrito tem algumas competências comuns a eles e outras atribuídas a estados. Ou seja, é um misto de ambos sem ser nenhum dos dois. As regiões administrativas parecem, sim, os bairros das outras cidades do país, só que mais independentes.
A autonomia é superior à dos bairros, mas menor que a das cidades que orbitam à volta das capitais estaduais. Não são cidades, mas também não são “cidades-satélites”, como era comum dizer antigamente. Um decreto de 1998 do GDF proibiu o uso da expressão em documentos oficiais, já que a idéia de “satélite” é meio pejorativa. Mas diante das diferenças, como explicar o DF a quem é de fora?
Cidade, sim
Marisol Carvalho prefere definir para as pessoas de fora Brasília como uma “cidade única”. Já o morador do Gama Joel Ribeiro, 41, discorda de Marisol. Ele afirma com toda certeza que o Gama é uma cidade independente.
Para o arquiteto Júlio Lobato, as opiniões diferentes são resultado de falta de informação. “O leigo aceita isso naturalmente.” Segundo ele, essa falta de entendimento sobre as RAs está ligada às questões que nasceram com a criação das ocupações não planejadas. São questões históricas.
O arquiteto explica que Brasília era uma cidade planejada para fugir do convencional. “Não há avenidas nem outras características de cidade grande. Era só o Plano Piloto. Para dar moradia aos operários das construtoras, houve a necessidade de se criar os núcleos habitacionais – as atuais regiões administrativas.” Ele reforça o pensamento de Marisol Carvalho: “Quando vou para fora do DF, prefiro dizer que moro em Brasília, que é o Plano Piloto, e que as cidades-satélites se equiparam aos bairros tradicionais das cidades brasileiras”.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) contribui para o desencontro geral. O órgão considera o quadrilátero do Distrito Federal como um único município e as 29 RAs, exceto o Plano, como setores habitacionais. Assim, os dados estatísticos do DF apurados nacionalmente não são divididos internamente, o que dificulta ao brasiliense – e ao brasileiro – ter uma clara noção das diferenças econômicas e sociais da capital.
A ausência de nomenclatura uniformizada sobre o DF deixa dúvidas e abre discussões. Na internet o debate é dominado sobre o fato de os Correios adotarem as RAs como bairros e não municípios. Em janeiro, o órgão soltou uma norma ensinando os brasilienses a preencherem endereços em cartas e formulários. A idéia é que cada RA seja um bairro. No campo “Cidade” se escreve sempre Brasília. DF fica sendo o estado. Se a região administrativa tiver uma divisão interna, esse é o bairro. Entre parênteses vem o nome da RA.
De acordo com os Correios, a normatização é para facilitar o sistema de endereçamento de correspondência e formulários. A empresa aconselha, contudo, que o mais importante é não errar o CEP, talvez prevendo ainda mais confusão pela frente.
Fonte: Universidade Católica